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Yaboty Ultra Maraton e Fiambala Desert Trail
Duas das provas mais legais na Argentina tem inscrições disponíveis no MidiaSport.
Yaboty Ultra Marathon (maior corrida non stop de selva) 19/09/2015
Essa está na minha lista, paisagem de floresta perto da divisa entre Brasil e Argentina na província de Misiones, com 5 distâncias para avançados e iniciantes 12, 26, 42, 70 e 100km. Clique para inscrição.
O mesmo organizador promove uma corrida em deserto, a Fiambala Desert Trail, 6/6/2015 a prova é toda por areia, num cenário maravilhoso com montanhas de mais de 6mil metros ao redor, algo realmente inóspito e diferente, fiz 80km em 2014 (clique e assista ao vídeo) e para 2015 parece que a logística ficou mais fácil para a torcida com largada e chegada no mesmo local. Província de Catamarca com 10, 35, 54 e 95km. Clique para inscrição.
Ambas tem inscrições disponíveis pelo MidiaSport.
Fiambala Desert Trail 80km, parte 2, a corrida!
A corrida!
Depois de toda aventura para chegar até Fiambala (clique e leia texto 1) na linha de largada, saímos da pequena cidade e logo estávamos na escuridão do deserto entre areia e arbustos quase sem folhas por culpa do outono, olhar brevemente para cima e ver a Via Láctea rasgando o céu todo estrelado era um espetáculo, não gosto de correr a noite, mas aquilo me motivava e sabia que logo o sol viria celebrar a corrida. Larguei literalmente por último para fugir do efeito manada de qualquer largada, com 10min e ainda com batimentos bem baixos, 140, comecei a ultrapassar os mais afoitos, nas corridas noturnas é fácil identificar grupos, nesse caso por várias vezes liderei alguns deles e a adrenalina aumentava ao ter que procurar as marcações que refletiam com a luz da lanterna, como não havia pista demarcada e as vezes os pontos estavam distantes, essa tensão e atenção fazia o tempo passar mais rápido, cheguei ao 1º posto de abastecimento no km 16, em 1h43, corrida fácil até aí, saí dos 2100m de altitude e desci até 1600m, a caminho do posto nº 2 já perto da largada dos 50km, ainda estávamos correndo para o Leste, vento da esquerda, como previsto, indo para o Sul, o sol começava a dar contorno as montanhas à frente e encontrei novamente meu amigo de Facebook, o Carlos, que começou a falar ao celular muito entusiasmado, disse que o dia clareava, que uns locais lhe haviam dito que por ali passou o Dakar, que a areia nos estava colocando em nosso devido lugar “ditando o ritmo” me fez dizer algumas palavras sobre a corrida e depois me contou que estava ao vivo na rádio que ele trabalha como jornalista, rs.
O dia clareou e junto com o sol, um show de cores nas montanhas, passamos pelo único rio do percurso, e perto de todo rio tem um povoado, aquele se chamava Taton, cidade que sediou a largada da turma dos 50km, subimos e descemos um morro por estrada de terra e pedras alcançando o posto 2 com 34km.
Novamente mais areia fofa já seguindo para o sul, para depois pegarmos uma estrada, uma reta interminável com vento soprando areia, era quase 11 da manhã quando parei para passar protetor solar e colocar o boné e o óculos de sol, rapidamente tudo se encheu de areia, estava abrigado atrás de um pequeno arbusto que não adiantou nada, mais de 1h naquela estrada acompanhando as montanhas dos dois lados, esse trecho serviu para dimensionar a corrida, comecei a sentir que a areia me tirava energia em cada passada, lógico que isso acontecia desde o início, mas no início o tanque está cheio.
Cheguei a outro posto de hidratação, o 3º, eles estavam bem distantes uns dos outros, levava entre 1h45 e 2h30 entre eles, e em cada um enchia o reservatório com água para certificar que não faltaria, saí da estrada e invadi as dunas novamente, impossível manter o ritmo de corrida, usava os batimentos como parâmetro e naquele terreno só era capaz de fazer uma corrida medíocre, era a parte mais difícil da prova tanto para o físico quanto para a mente, já havia feito 46km, mas ainda faltavam 34km e o ritmo era penoso, tudo isso te deixa na dúvida, mas é hora de lembrar nos bons treinos realizados e fazer a confiança voltar, sabia que estava lento pelo terreno e pela hora do dia sem um pingo de sombra a vista, segui em frente me adaptando ao ritmo que o percurso me impunha.
Cheguei ao posto 4, havia feito 60km o vento e a areia eram muito fortes e nada podia pará-los, naquele ponto já sentia o vento e a areia como uma tortura chinesa, sentei um pouco, respirei fundo, me tapei todo e voltei pra prova, ainda lento, percebi que não via fitas de marcação do percurso há algum tempo, mas continuei seguindo um corredor que via mais longe a frente, pensei que as fitas haviam sido levadas pelo vento, erro, quando percebi éramos um grupo perdido de 15 pessoas, a maioria dos 50km, sabíamos que a corrida rumava para o Sul e depois de um tempo vimos corredores descendo por um morro, até então não sabia o que havia perdido e sabia que não havia corrido menos que eles, pensava que eu estava correndo mais a direita, já que não havia pista. Depois soube que havia perdido a melhor parte, atravessar uma duna alta.
No posto 5, com 69km, faltando apenas 11km já havia desanimado da possibilidade de chagar com dia claro, estava muito cansado, a areia me desgastou aos poucos, mas lá encontrei os fotógrafos que viajaram comigo e me incentivaram, naquela hora a temperatura já começara a baixar e o percurso ficou bem pedregoso e dinâmico, tudo isso parece que me ajudou a voltar a correr melhor, aquela energia mental que nos inunda no último km chegou pra mim 10km mais cedo, para quem já estava sem joelhos talvez fosse a parte mais dura da prova já com 70km nas pernas, mas pra mim foi renovador, a confiança de chegar com sol havia voltado e me sentia bem, aproveitei esse momento para correr sempre que possível me sentia ágil pisando de pedra em pedra, é verdade que um tropeção de vez em quando me colocava alerta novamente.
Faltando 3km pegamos o único trecho de asfalto da prova, já era possível enxergar Fiambala à frente e o sol ainda levaria algum tempo para se esconder atrás da montanha mais alta no Oeste, cheguei na praça central moradores e corredores me aplaudiam com acanhamento, mas bastou um sorriso meu para que fizessem mais barulho, 12h25 depois de largar, finalmente completava esses 80km no deserto argentino e foi sensacional!
Assista ao vídeo da prova!
Como chegar:
- De Buenos Aires havia um pacote fechado com uma empresa de ônibus, que levava direto a Fiambala que está a 1400km da Capital Federal aproximadamente 18hs de viagem.
- Pode-se ir de avião desde Buenos Aires até Catamarca e fazer 350km de carro alugado.
O que usei na corrida:
- Tênis leve com cravos Skechers Go bionicTrail;
- Calça legging Adidas;
- Polaina de compressão e manguito OG;
- Polaina contra areia Noaflojes;
- Camiseta térmica Nike + camiseta oficial do evento;
- Corta vento Montagne e luvas Quechua no início;
- Mochila de hidratação Quechua Diosaz 10L;
- Boné Ansilta, bandana Guepardo e óculos de sol Briko.
O que comi:
Torrone, damasco seco, castanha do Pará, amêndoa salgada, 2 cápsulas de cafeína (100mg), 1 gel de carboidrato, muita água, meia banana e powerade oferecido pela organização.
Enzo Amato
Fiambala Desert Trail 80km, parte 1, chegar!
Sensacional desde o princípio.
Lendo o site, me encantou a ideia de ter que viajar muito até chegar no local da corrida, isso a deixava mais rústica e menos populosa, sentia que isso só levaria corredores motivados simplesmente a correr, não tinha como não lembrar do livro Nascidos para correr, onde um pequeno grupo de ultra corredores viaja por muito tempo, até muito longe de tudo só para poder correr. Desta vez eu era o personagem real, e lá estava eu, no norte argentino, colado nos Andes, mas além de montanhas altas, muita areia, dunas, pouco verde, aridez, muitas paisagens e vento sul, no deserto que foi palco do Rally mais famoso do mundo, o Dakar, pronto para correr 80km.
Sai de casa às 9:30 da manhã e só chegaria em Fiambala 30hs depois, um voo de SP a Buenos Aires e mais 1400 km num ônibus com a turma da organização da prova e fotógrafos, minha aventura já havia começado e eu a desfrutava 100%, ainda no ônibus, tendo que cuidar da alimentação, já que 48hs antes de uma corrida importante é o melhor momento de ingerir carboidratos que servirão de combustível na corrida, tinha uma sacola cheia de comidas e me virava nas paradas do ônibus, tudo era parte da história. A viagem foi muito tranquila, dormi toda a noite e com o amanhecer fui notando a mudança na paisagem, o verde desaparecia e dava lugar ao marrom das rochas e montanhas e depois de 18hs no ônibus chegamos ao hostel onde a organização ficaria hospedada e entregaria os kits da corrida no dia seguinte.
Pude ajudá-los um pouco, desde montar as caixas dos kits até descarregar caminhão com as bebidas que iriam para os postos de hidratação. A temperatura era uma mistura de agradável ao sol e frio à sombra, porém com vento era sempre frio, e pelas dúvidas eu estava sempre agasalhado.
Sexta a noite, véspera da prova fui ao congresso técnico, lotado de atletas e algumas autoridades locais, já tinha toda minha mochila e roupas organizadas, só faltava jantar e descansar algumas horas, pois o ônibus que nos levaria até a largada partiria às 3:15 da manhã. Ainda no congresso percebi o quanto a província de Catamarca estava envolvida em promover o evento e sabia da oportunidade de desenvolvimento turístico da região com a corrida, prefeito e secretária de turismo discursaram brevemente mostrando gratidão e entusiasmo com o que faríamos dali a algumas horas. Até eu fui aplaudido por ser dos poucos estrangeiros na prova, uma piadinha sobre a copa, risos, aplausos e me senti muito bem acolhido.
Dormi bem as poucas horas que me correspondiam apesar de ter mais 2 pessoas dividindo o quarto comigo, o banheiro era compartilhado (fora do quarto) e com medo de estar ocupado na hora que eu precisasse me arrumar, já colei os esparadrapos no pé antes de deitar e deixei a lanterna por perto para me vestir no quarto mesmo assim que acordasse, às 2:40.
3:15 estava na praça, tínhamos ainda 50min de ônibus e uma pequena cochilada até chegar a praça da cidade de Palo Blanco, local da largada. Ao descer do ônibus, meu segundo passo foi para o lado por causa do vento, esse era nosso receio, muito vento, que levanta poeira e areia e nos impossibilitaria de enxergar, a previsão era daquelas que se espera de tudo um pouco, frio, vento Zonda (vento quente com terra) calor… ainda no congresso o prefeito disse que teríamos vento sul, ou seja nas costas, já que os últimos 50km também iríamos para o sul. Enfim, depois do baque ao descer do ônibus, fui me abrigar do vento num prédio municipal já lotado de corredores, guardei a jaqueta na mochila entreguei no guarda volumes para seguir até a chegada e vesti meu corta vento, estava pronto. Minutos antes da largada um amigo de facebook da província de Entre Rios me reconheceu, nos cumprimentamos, tiramos foto e minutos depois estávamos prontos para largar com outros 180 corredores para fazer 80km, era pouco mais de 5 da manhã quando a corrida começou.
Clique e leia a parte 2, a corrida! E assista ao vídeo.
Enzo Amato
Fiambalá Desert Trail, corrida no deserto argentino.
Meu grande desafio de 2014.
Pra quem leu o livro Nascidos para correr, onde alguns poucos ultra corredores viajam muito até chegar num lugar longe de tudo para poder correr, é impossível não relacionar com a Fiambalá Desert Trail. Basta navegar pelo site da prova, ver onde fica a cidade, como faremos para chegar e perceber que a aventura já começa por aí. É só para quem tem esse espírito.
Claro, se você leu o livro e pesquisou o site, talvez ache que eu esteja exagerando, mas o que quero dizer é que esse tipo de prova começa muito antes da largada. Tudo tem que ser pensado antes, e nas provas desafiadoras, esse tudo nos tira da zona de conforto acaba alimentando a ansiedade que tem que ser controlada com uma dose maior de auto confiança. É desse tipo de prova que gosto! Em que ritmo vou correr, o que vou comer, o que vestir…? Tudo é influenciado pela viagem que começa 3 dias antes da largada, ainda não sei nenhuma dessas respostas, mas traço alternativas para várias situações e já comecei a fazer uma lista do que preciso levar, os treinos para me deixar cada vez mais resistente e forte, o planejamento do que comer na longa viagem de ônibus no dia que o corpo mais precisa de energia, 48hs antes da prova, quais as comidas que gosto durante a prova que podem entrar no país…
Aí percebo que a prova já começou e ainda faltam mais de 2 meses. Será que as provas que não me tiram da zona de conforto conseguem me motivar dessa forma? Essa resposta eu sei, não!
Escolha uma distância razoável para seu condicionamento e curta essa aventura desde já!
Enzo Amato